A isto se chama destino: estar em face do mundo, eternamente em face (Rilke)

domingo, 31 de agosto de 2014

DESPEDIDA



Desvio agora o olhar, e vejo que uma pequena legião desce os degraus das escadarias da velha igreja, guiada por um vulto de veste negra, acima dos demais na altura; de sorte que me certifico logo se tratar do pároco da aldeia, de feições um tanto sérias e princípios não menos conservadores. Lá de cima, o badalar do sino ganha uma nova melodia e um ritmo mais lento. A missa já havia acabado, e teria de encontrar uma desculpa aos meus pais para justificar a minha ausência. Mas naquele dia tudo era permitido, pois que era um dia de despedidas.
           Desço a montanha em disparada, voando para o abismo, as pernas destrambelhadas até parar lá embaixo, com o coração cuspido pela boca. Se era para enfrentar o pior, do que temer? Como disse, tinha por ocasião 12 anos de idade e estava para entrar na adolescência que, por sorte ou azar, seria vivida em grande parte no seminário, recluso junto com outros garotos, numa grande construção cercada por uma extensa mata. Devia dar graças a Deus pela possibilidade de estudar na companhia de filhos de famílias dotadas de um bom poder aquisitivo. Eles eram mandados para lá para ajudar na sua formação e eu para salvar a mim e a minha família de maiores desgraças.
(Do livro "A Caminhada ou O homem sem passado")

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