A isto se chama destino: estar em face do mundo, eternamente em face (Rilke)

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

RESENHA


Jack London, um caçador

de aventuras

 

Roberto Nicolato

   O escritor norte-americano Jack London é um narrador de aventuras, um explorador da alma humana e das relações sociais. Ler o Lobo do Mar, publicado originalmente em 1904  e lançado recentemente pela Zahar Editora,  é embarcar numa viagem a um mundo insólito e cruel, capitaneado pelo poderoso e inescrupuloso Wolf Larsen, personagem que leva a cabo, e à sua maneira, as teorias darwinianas da evolução das espécies para justificar as suas atitudes amorais e cruéis no comando de uma embarcação rumo à caça de focas no mar do Japão.
      A história começa em São Francisco, nos Estados Unidos, quando o narrador da história, o crítico de literatura, Humphrey van Weyden, sofre um naufrágio no barco em que utilizava para visitar o seu amigo do outro lado da baía.  Após o incidente,  Weyden é salvo pelo capitão Larsen, e, ao contrário do que imaginava  - a esperança de que seria deixado em terra firme -, logo se vê forçado a  integrar a tripulação do navio.
    De intelectual e cavalheiro almofadinha, sem nunca ter tido contato com qualquer esforço físico, o narrador é nomeado por Larsen na modesta função de camaroteiro do veleiro Ghost. Um pesadelo para Weyden, a começar pelas constantes humilhações que tem que enfrentar, vindas do cozinheiro rabugento e mesquinho Mugridge, das tempestades em alto mar e das atrocidades cometidas por Larsen contra aqueles que ousassem descumprir suas ordens.
Com o passar do tempo, Weyden chega à funcão de imediato  e toma consciência de que não há como fugir do julgo do capitão, com o qual passa a discutir filosofias, pois que os instintos primitivos daquele não o impediam de estar na constante presença dos livros. Na realidade, Larsen é tido como um darwnista de carteirinha e acredita que, independente da moral e da civilidade, a exemplo do mundo animal, o que deve prevalecer nas relações humanas é sempre a lei do mais forte.
    O universo opressor em alto mar e a ascendência de Larsen sobre a tripulação do Ghost acaba, aos poucos, por enfraquecer os desejos de revolta de Weyden que vê no capitão a imagem do homem forte, belo e destemido, embora não menos cruel e ameaçador. Essa resignação, no entanto, toma outro rumo na medida em que London insere na narrativa a delicada Maud Brewster, escritora que também é salva de um naufrágio. A figura feminina, em contraste com o primitivo Larsen, será responsável pela guinada de rumo na narrativa de Jack e na própria disposição do narrador, por quem se apaixona.
   Como bom jornalista, London pesquisou muito antes de escrever  O lobo do Mar. Sabe-se que Larsen foi inspirado na lenda criada em torno do capitão Alexander MacLean, que também caçava focas. O próprio London fizera uma viagem ao Japão em 1893, no Sophie Sutherland, onde alternava o trabalho pesado com as leituras de Moby Dick, de Melville, obra que está na fundação do romance moderno. Na verdade, muitos de seus livros são pautados pela experiência pessoal e para quem a vida tinha sido marcada por intensas aventuras.
    Logo de saída, O Lobo do mar tornou-se grande sucesso comercial: em dez dias esgotou-se a tiragem de 40 mil exemplares. Antes dessa obra-prima, o autor havia publicado O chamado selvagem, retratando o inesquecível cão Buck, e cuja obra também colocava em discussão os binômios natureza e cultura e civilização e barbárie, enfim de como é necessário o refreamento dos instintos humanos para que prevaleça o devido e harmonioso convívio social. Nesse sentido, Freud estava coberto de razão.

O Lobo do Mar, de Jack London
Tradução de Daniel Galera
Zahar Editora – 367 págs.

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